quinta-feira, 14 de maio de 2009

"Quem não sabe, é como quem não vê."



sobre “ O Quarto”


As manifestações de carinho de Rose para Bert, embora tímidas, estão sempre presentes desde o início da peça. Apercebemo-nos que a grande preocupação de Rose é manter a paz dentro de sua casa e que tudo o que esteja no exterior do seu refúgio é uma ameaça. A insistência de Rose em dizer que está bem no sítio em que vive e que é feliz junto de Bert, como se quisesse convencer-se a si mesma, faz-nos questionar se, de facto, será assim. Na verdade, o que ela quer realmente dizer é que tem pavor do escuro, do frio, da noite e do desconhecido mas não consegue expressar o que sente.
Rose pede a Bert, por palavras silenciosas, que lhe dê calor, amor, segurança e conforto, mas Bert nunca responde... Este silêncio sublinha o medo de Rose, a sua solidão, mesmo quando Bert está em casa e a presença autoritária deste sobre ela.
Rose insiste em dizer que não quer viver na cave, porém pretende desesperadamente saber quem vive no piso de baixo. A cave cria assim uma atmosfera de mistério.
A visita do senhorio, que esperava encontrar Rose sozinha, reforça as falhas de comunicação e a incerteza constantes entre os personagens. Estes não se escutam devidamente, nem respondem ao que lhes é perguntado. Talvez esta forma de comunicar seja um escape, através de respostas ilógicas, ao que está a ser perguntado.
Durante a ausência de Bert, Rose aguarda-o impacientemente, temendo que alguma coisa lhe aconteça (“It´s murder out”).
Quando Rose recebe a educada Clarissa Sands e o arrogante Tod Sands apercebemo-nos que, durante toda a conversa, a atenção de Rose está centrada na cave. Notamos também no desinteresse pelos andares de cima por parte de Rose. Aliás, o próprio Sr. Kidd já os deixou de contar.
O Sr. Kidd disse a Rose que os vizinhos de cima foram embora, talvez seja este o quarto que Clarissa e Tod procuram alugar. Porém, Rose não se recorda desta conversa, ou talvez nem tenha chegado a ouvir o Sr. Kidd.

Todas as inseguranças são materializadas em Riley devido ao seu passado incerto e todo o mistério em volta desta personagem. A chegada deste intruso, que Rose reconhecesse imediatamente mas finge não conhecer, vai “despir” Rose de tudo o que tem tentado dizer sem conseguir. Riley quebra o silêncio chamando-a pelo seu nome secreto de criança e acarinha-a contrariamente ao seu marido que nem lhe dirige a palavra. A única coisa que Bert diz, antes de assassinar Riley, é sobre a sua carrinha.
No final, o intruso não era nenhum estranho e o perigo não estava no exterior do quarto…Bert foi sempre o inimigo.
Riley poderá ser a personificação do subsconsciente de Rose, que vive resguardado na cave evitando Bert que reprime os pensamentos da esposa (neste caso Bert lutaria contra o desejo de Rose de deixá-lo); poderá ser um amante que Rose tenha deixado no sítio de onde Bert a trouxe, poderá ser o próprio pai que vem em busca da filha disputando-a com Bert, ou poderá ainda ser a figura da Morte que, como mensageiro de Deus, vem buscar Rose para que retorne a casa do Pai…
Pode ser tudo isto, pode não ser nada disto…pode ser tudo mais. Porque é Pinter e porque, citando Stephen Lacey, “a realidade é problemática e incerta e os seus significados ambíguos e transitórios”.
(imagem à esquerda Mary Beth Peil e Earle Hyman)

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